VAMOS ACABAR COM OS CARTÓRIOS?

 

Autor: Dr. Sérgio JACOMINO , in "Editorial", no Site do 2° Registro de Imóveis e Anexos de Franca - SP.

Mais uma vez estamos verificando a falta de seriedade no debate instaurado pela imprensa acerca da real utilidade e da necessidade de serviços públicos notariais e registrais no Brasil.

 

Mais uma vez esse debate - que poderia ser útil e proveitoso para o aperfeiçoamento de nossas instituições jurídicas - descamba para uma lamentável sucessão de equívocos e imprecisões técnicas que chegam mesmo a surpreender, se considerarmos que exprimem uma visão - distorcida, é bem verdade - de um Juiz de Direito, de quem se espera sempre sobriedade e moderação. Refiro-me ao magistrado Urbano Ruiz na entrevista publicada pela Folha de São Paulo de 14/2/97, entre outras.

 

Mas, facilmente chega-se à conclusão de que essa diatribe não convém às pessoas sérias e devotadas de nossa categoria que emprestam à causa pública as suas melhores qualidades. Os argumentos esgrimidos nessas reportagens não são verdadeiramente relevantes. O absurdo da proposta, de extinção pura e simples dos serviços notariais e registrais no país, é de uma indigência intelectual desconcertante. Seria o mesmo que propor o fim da aviação civil porque caíram algumas aeronaves, ou matar as pessoas nas ruas para provar a falência da segurança pública...

 

Fica aqui consignado que os serviços notariais e registrais no mundo contemporâneo gozam de especial prestígio e importância. E aqui mesmo, nesta página, há a indicação de inúmeros sítios que poderão ser visitados e constatada a veracidade do que afirmo.

 

Mesmo nos países em que não há a tradição de um notariado de perfil latino, como é o caso dos Estados Unidos, há uma tendência significativa de valorizar a figura do notário como profissional do direito que, com independência e preparo técnico, reduz a vontade das partes em instrumentos dotados de fé pública. A palavra chave é autenticidade. Confira as notícias que nos dá Ted Barassi , e a American Bar Association .

 

Portanto, se existe algo a ser feito agora, isto chama-se trabalho. Trabalho e serenidade. Como não se trata de uma discussão séria, é bobagem tentar responder às essas invectivas. Vamos estudar, aperfeiçoar ainda mais o nosso trabalho. Mostrar à sociedade que existem homens íntegros e sérios que suportam as instituições que representam e prestigiar o nosso Tribunal de Justiça no sentido de apurar as irregularidades que ainda possam existir nos serviços notariais e registrais, sempre consagrando o devido processo legal e garantindo a ampla defesa.

 


 

SELOS DE AUTENTICIDADE

 

Nessas reportagens, tem-se debatido acerca do selo de autenticidade para os atos notariais. Afinal, quem o concebeu? Quais as suas verdadeiras finalidades? Para quem não sabe, o proto selo de autenticidade - que hoje é adotado no Estado de São Paulo, apresentado em moderna impressão holográfica - foi criação de D. Dinis.

Por lei de 1305, D. Dinis determinou que, além da presença de cinco testemunhas, para a validade e autenticidade de algumas escrituras lavradas por tabeliães portugueses, deveria haver a aposição de um selo que deveria existir em cada cidade, vila ou julgado.

Os selos dos concelhos, como eram então chamados, deveriam conter, nas palavras régias, "os meus sinais e letras que contam o meu nome e o nome da cidade, ou da vila, ou do julgado". O selo seria confiado a um homem-bom, de nomeação régia, jurado sobre os Santos Evangelhos e seria aposto em cera na escritura.

Rendemos homenagens às vetustas tradições que remontam à idade média. (Cfr. CAETANO, Marcello. História do Direito Português. 3a. ed. Lisboa : Verbo).


 

CARTÓRIOS, CHARTÁRIOS, CARTULÁRIOS, CARTAYRO...

 

"O sistema dos cartórios começou a operar a partir de 1917, quando entrou em vigor o Código Civil Brasileiro" (Urbano Ruiz, Folha de SPaulo, 14/02/97)

"...alias per series Testamenti, et alias per conligationes placitas, secundum in Cartarios , et in Inventarios nostros resonant" (Chatae de Santa Cruz de Coimbra. Por este documento de 1058, aqui reproduzido em parte, Gumice Alba doou ao Mosteiro de Campanhãa, junto à cidade do Porto, certas herdades que possuia).

Cartayro. Arquivo, cartório. Segundo registra o Elucidário, (Fr. Viterbo, 2a. ed. Lisboa, 1865) esta expressão se encontrou em documentos de Pendorada, datados de 1320.

Segundo ainda Marcello Caetano (Op. cit., p. 242 e ss.) , no período em que se formou o Estado Português (1140-1248), os documentos régios e os particulares (chamados de cartas - chartae) eram lavrados por notários, em sua maioria, para atestar a prática de atos jurídicos, incluindo as simples notícias ou atas.

Nesse período, a prova testemunhal desempenhava importante papel, já que o analfabetismo era acentuado, mas, mesmo assim, inúmeros documentos particulares foram conservados do período, como testamentos, contratos etc. chegando até nós coleções originais ou cópias que eram deles trasladadas.

Segundo Caetano, a razão para que se tenham conservado tantos documentos particulares deve-se ao fato de que alguns originais, outros apógrafos (traslados ou cópias reunidos em coleções chamadas "cartulários"), justificavam o domínio de alguns proprietários. Assim, essas coleções de documentos - cartários ou cartórios (de Charta) - pertenciam sobretudo às corporações monásticas ou às mitras, que possuíam grandes patrimônios constituídos de centenas de prédios, em plena propriedade ou foreiros.

É muito interessante verificar a necessidade que já então se sentia de reduzir a vontade das partes a escritos lavrados por notários, isso por um lado. Por outro, a necessidade de justificar o domínio - o que nos faz logo pensar na oponibilidade - que fez nascer fólios que eram os repositórios de títulos, cartas, depositados em lugares específicos, que vêm a ser exatamente o ancestral institucional dos nossos registros prediais.

Se o registro imobiliário pode ser remontado a partir de antiquíssimos exemplos hauridos do direito grego, egípcio e assírio, não deixa de ser importante a investigação do direito português.

 


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